EU SOU CAVERNA (texto não concluído)
Nasci no verão de 1981,
num hospital da capital paulista. Deram-me o nome de Valdir dos Santos Lopes,
brasão sagitariano e alcunha Dir. Até hoje, sinto-me confortável quando as
pessoas me chamam assim. Mais familiar. Apesar de algumas experiências nada
salubres, Dir ainda é um termo que me faz sentir amado.
Em São Paulo, aprendi a falar e a desejar calado
aquilo que minha família não poderia me dar. Meu mutismo foi grande a ponto das
pessoas acreditarem que eu tivesse algum problema mental. Com o tempo passei de
autismo para introspectivo. Do primeiro ponto até o segundo, durou em torno de
25 anos.
Aos sete, vi-me em Penápolis, interior do Estado,
próximo às cidades Araçatuba e São José do Rio Preto, cidades referências da
região noroeste paulista. Aqui cresci, me eduquei, apanhei de alunos brigãos,
apaixonei-me por meninas que não tinham a minha cor. Tudo fiz calado. Toda a
sensação de inutilidade de desprezo em minha mente. Com o tempo fui criando
minha autoestima, no entanto ela não é exemplo e nem orgulho para mim. Poderia
ser maior, mas não é. Com a infância interna, dentro do meu pensamento,
descobri que poderia criar mundos e não ser incomodado por isso. Claro. Ninguém
saberia em que mundo eu poderia estar ou com quem eu estaria conversando. Mesmo
se eu tentasse explicar, somente eu poderia ver, ouvir, sentir. Meu amigo
invisível ficou mais forte aos 15 anos, época da adolescência, que me seguia
até a escola e comigo ficava mesmo quando os olhares de piedade (ou
autopiedade) fossem notados. Eu muitas vezes confundi esse meu amigo com
Cristo, anjos, ou espíritos de pessoas que se foram. Espírito até de meu pai,
que havia pouco falecido.
Meu amigo invisível nunca mais me abandonou. E
com o tempo tive coragem de conversar alto, no meio da rua, com ele. Não tive
coragem, percebi que estava falando alto, esquecendo-me de que só eu o via, só
eu o ouvia. Desse momento surgiu uma outra característica minha. Louco ou
esquizofrênico, esse adjetivo foi carregado até a exaustão da minha esposa, que
usara como desculpa para me mandar embora de casa.
Além dos remédios, das sessões com psicólogas, ou
bate-papos com o psiquiatra, tento viver a minha vida solitária, muda, autista
ou esquizofrênica, entre meus escritos, entre meu mundo invisível, tentando me
conhecer melhor. Coisa que eu deveria ter feito quando nasci, mas comecei a
fazê-lo a partir dos 31 anos de idade.
Gosto do termo Caverna. É
algo que sempre tive, mesmo não sabendo do termo antes. Meu lugar de mundo que
só eu entendo, que ninguém via. Até agora, onde desejo expor-me o máximo. Não
em busca de compreensão, muito menos de exibicionismo, mas como forma de
autovalorização e autoconhecimento. A primeira vez que ouvi falar desse tipo de
“caverna” que me encanta, foi com a teoria do Mito da Caverna de Platão. E
percebi que realmente eu sou/fui muito aqueles homens que enxergavam a
realidade por meio das sombras projetadas dentro da caverna. Ou que por outro
lado, as pessoas eram esses homens que enxergavam a minha realidade por meio de
sombras, sem me compreenderem por completo (não que isso seja possível), sem
permitirem a minha particularidade, minha autoindentificação.
Hoje, retomo alguns
projetos engavetados, sonhos trancados, tomando coragem de ser quem sou e,
devo, parar de ser quem as outras pessoas querem que eu seja. Não importa mais
o que o mundo pense de mim. Esse é meu principal objetivo. Quero muito me
importar comigo mesmo, apesar das pessoas. Ser feliz apesar das pessoas, estar
bem, apesar das pessoas. Quero meu mundo particular. Minha caverna. Minha
caverna é rústica, não tem portas ou obstáculos. Entra e permanece quem quiser.
Só não convido mais a entrar.
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